quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Os melhores de Junho

Montagem com fotos diversas recolhidas na Internet


O mês de junho revelou algo que este blogueiro já avisava ano passado: mais um passo foi dado para que nossas antes tímidas quadrilhas pudessem ser comparadas às imperadoras do Pernambuco. Entre grupos que quase não puderam se apresentar devido falta de recursos e grupos que mostraram muito perfeccionismo na escolha de seus temas, o saldo foi além de positivo, garantindo emoções, admiração e entretenimento àquele que, no final, mais vale na Açailândia Junina: o público. Dessa forma, é tarefa hercúlea definir quem e o quê se destacaram em meio a tantos talentos em movimento e temas cada vez mais refinados. Embora não seja exatamente um Hércules, K. Fera descreve o que houve de superior ao melhor no ano que a Açailândia Junina rompeu verdadeiramente todos os limites, alterando o DNA dessa festa para algo ainda mais sublime.

Melhor arte de banner
Se ano passado tivemos verdadeiras apoteoses de criatividade, em junho de 2015 esse limite se rompeu de maneira mais abrangente, chegando inclusive ao tema. Dizem que uma imagem tem valia superior a mil palavras e no nosso país, onde as pessoas preferem ver TV a ler um livro, torna a citação ainda mais eficiente. O banner mostra nas redes sociais não apenas o tema que se deseja falar, mas deve acima de tudo oportunizar ao público a ideia por quais vias o grupo junino vai seguir para contar essa história. A suavidade do banner da Koroné conseguiu exatamente apontar que direção eles estavam mirando. Os elementos da história de amor entre Solano e Luara em tom lúdico, articulando sonho, fantasia e um pé na realidade estavam todos lá, materialmente observável. A intersecção entre a escuridão e a claridade, que muito me agrada, devem ter seduzido esse artista, inspirando-o para realizar o mais belo banner da nossa Balsas Junina.

Melhor Noivo
Esse pódio é relativamente novo, afinal escrevo há exatos dois junhos consecutivos, dessa forma ainda não poderia ver como proeza o fenômeno a seguir. Novamente elejo Lauender França como o melhor noivo da estação. Cada vez mais o trabalho do noivo da Queridinha caminha para a perfeição; é incrível como esse personagem real entrega-se para seus temas, suas coreografias, suas cenas de tal forma, que não há mais como dissociar Lauender à figura do noivo. "Moça, seus coco". Talvez se algum dia ele venha a ser outro personagem, discutirei comigo se de fato estou vendo uma apresentação da nossa Flor. Num de seus melhores momentos, durante a canção “Se tu quiser’, dançarino e ator se unem em apenas uma face e garante um personagem apaixonado e verossímil. Como disse, esperamos ele se casar mais vezes em nossos arraiais.

Melhor Noiva
Com uma postagem dedicada somente a elas, as personagens que carregam o mais trabalhado vestido de seu grupo, tal pergunta torturou o inconsciente desse blogueiro. Tivemos atuações memoráveis, portanto cabe aqui novamente imortalizar os nomes de Joselita, Valéria, Ana Beatriz, Ágda e Gleivane. Há entretanto um fator capaz de definir tranquilamente quem delas merece uma vírgula a mais de destaque. E a escolhida foi a artista Joselita Marques. É incrível como o trabalho multiartístico dessa personagem real é desenvolvido. Joselita entrega-se completamente ao tema de seu grupo junino e realiza uma façanha: sua personagem toma fôlego e parece querer saltar do arraial de tanta vida. Grande parte da sua vitória, também se deve então à personagem que a Imperadora ofereceu: uma noiva que foge do padrão. E exibindo um dos penteados mais incríveis dos nossos arraiais – talvez por tal surpresa o adereço do ano passado cobriu quase completamente o cabelo da moça.

Melhores coreografias
Coreografia é um todo. E elas traduzem bem o fulgor dos grupos juninos. Entre passos mais tradicionais e outros mais arrojados, as coreografias realçam o poder de uma canção e garantem que nossos protagonistas dançarinos também se divirtam na execução de uma trilha sonora. Saber que nossos heróis estão em pleno êxtase quando executam alinhadamente (ou não) as coreografias propostas, de uma forma que minha limitada condição de público não permite explicar, toca no coração da plateia. Apesar de várias conseguirem chegar a isso, uma delas ousou mais que poderia. A nossa querida Imperadora garantiu tanto que nossos dançarinos se divertissem, como também incluiu em seu desenvolvimento tampas de panelas, cabos e outros apetrechos que garantiram novidade ao espetáculo junino em Açailândia. A pegada coreográfica altamente teatral, que esteve nas mãos de Walisson, Joselita e Tharles, foi bem sucedida. Esperamos que mais inserções desse nível sejam realizadas!

Destaque coreografias
Impossível mudar de categoria sem nos lembrar que a representante do Maranhão trouxe o cacete e o coco nas mãos das nossas damas – e somente nas mãos delas. Porém uma ideia coreográfica deixou o espetáculo da nossa Flor ainda mais emocionante: a inserção dos cavalheiros no auge do sétimo minuto do espetáculo foi mais que fabuloso. Sobretudo porque a música para e eis uma surpresa: nossos cavalheiros transformaram-se em cercas que prendem as quebradeiras de coco. Decerto, esse é meu momento predileto, pois há uma simbiose entre música, teatro e coreografia bem próxima à perfeição! Algo a servir de exemplo.

Melhor canção

Tantas as músicas embalaram a diversão de nossos jovens açailandenses, mas não há sombra de dúvida que canção devo eu escolher. Esse ano, a trilha sonora da nossa Queridinha conseguiu surpreender, emocionar e divertir num balaio só. A escolha do repertório aliou-se à progressão da história e fez o que uma boa canção também deve fazer no espetáculo junino: demarcar eventos do enredo. Entre todas, destaco a mais que excelente escolha do músico tão pouco explorado Genésio Barros, Coco Livre S/A, que para quem não lembra, guarda o agora imortal refrão “pra quebrar o coco o cacete tem que ser duro”. Nessa canção, encontram-se tantos elementos que falam desde o sofrimento à alegria das nossas quebradeiras e de quem vive do coco. Posso dizer que garimparam uma verdadeira pérola musical!

Destaque Canção
Impossível não se deleitar na execução de A Lua e o Sol que nossa quadrilha sulista propõe. A riqueza da canção agarra-se fortemente ao tema e mostra que o repertório da nossa Koroné não foi definido pelo mero acaso. Trata-se até de uma canção já explorada, porém a ela ganha ainda mais elegância e fulgor nos trajes e nos movimentos singulares do grupo junino de Balsas.

Melhor marcador
Um marcador deve disseminar emoção a um tema de cunho documental ou então trazer ainda mais suavidade a um tema alegre. Inacreditavelmente, meu eleito Gustavo conseguiu perfazer esses dois caminhos. O tema da nossa Flor exigia ainda maior voracidade de seu marcador e tiveram uma excelente surpresa com o menino Gustavo este ano. Vestindo-se de um personagem condutor de um enredo interessante, o marcador deixou sua figura se aproximar a do padre Josino fisicamente, vocalizando a história de amor entre Raimunda e José, além de conduzir a história de luta atemporal das quebradeiras de coco. Gustavo passeou entre esses momentos de maneira saudável e contou uma história de dentro para fora. E o mais emblemático acontece ao final, quando seu personagem é assassinado e deixa-se nas mãos da personagem Raimunda a triste missão de finalizar o espetáculo. Por oferecer mais que pedimos, Gustavo é o eleito este ano.

Melhor Figurino
Nossos artistas também tiveram alguns acessos de criatividade este ano no que diz respeito aos figurinos. Porém a criatividade se traduziu em representar exatamente os temas que propunham, como se nenhuma vírgula pudesse escapulir do plano proposto. As cores e os tecidos respeitaram exatamente o que se queria falar, mostrando um resultado adequado, porém nem tanto inovador. O quê mais destacaria em matéria de novidade, dentro dos limites da Açailândia Junina, foram as sandálias trazidas por dois grupos juninos. Porém, pelo conjunto da obra, elegerei o salto alto. A nossa quadrilha balsense teve os figurinos, que respeitavam o confronto entre a claridade e a escuridão, executados impecavelmente! Some-se a isso a exuberância dos figurinos, que ficaram extremamente elegantes. É lindo observar a Koroné do alto, vendo as cores de seus tecidos, escolhidos preciosamente, dançarem alegremente pelo arraial. Graças a essa fantástica impressão que temos com o produto final, elejo-a.

Destaque figurino
No ano em que não tive grandes dificuldades de definir quem seria a medalhista dessa categoria, nossa Queridinha me faz duas surpresas. A primeira, embora seja um efeito até recorrente entre as devoradoras pernambucanas, a troca de figurino das quebradeiras no meio da apresentação como um truque de mágica garantiu um púlpito maior da plateia. E também, não há como não destacar a bela execução dos figurinos amarelos da rainha e o rei, ambos inspirados no cofo, objeto que carrega o babaçu. Inicialmente achei que esse elemento deveria estar estampado em todas as damas, mas logo depois entendi que a nobreza dessa ideia residia em vestir apenas a personagem destaque desse enredo. Aplausos, Flor.

Melhor enredo
Não há dúvidas que todas as histórias contadas, seja pelo caráter documental, histórico, mítico ou apenas de entretenimento tiveram bons enredos. Indiscutivelmente, o enredo dos nossos Caipiras, dramaturgicamente, é o melhor. A história que nossos heróis do bairro Plano da Serra versando sobre a busca pela turmalina é muito agradável de se acompanhar pois naturalmente possui uma progressão adequada e mantém um clímax emblemático: o momento do aparecimento da Turmalina como noiva  − cuja imagem ao lado traduz bem a beleza desse momento. Acredito que apesar a despeito de outros fatores, o texto puro de Gleivane e companhia provam que para que boas histórias sejam contadas, elas não precisam ser inovadoras ou nunca exploradas. Como se conta uma história é o que interessa ao público. Esse sim precisa sentir estar levando algo novo para sua existência terrena. Parabéns!


#OlhoAtentoConstrutivo

- A trilha sonora da Imperadora teve escolhas mais preciosas e outras nem tanto. Porém, o problema reside na seleção de músicas antigas, que não foram remasterizadas, e causaram alguma estranheza aos nossos ouvidos.

- A trilha sonora que acompanha a personagem Cleópatra do grupo Caipiras que entre tantas canções instrumentais, não foi a melhor escolha.

- A irregularidade dos figurinos das quatro quebradeiras de coco que iniciam o prólogo da Flor de Mandacaru. Uma delas (Margareth Marques), em especial, mantém um figurino muito adequado, desenvoltura espontânea, lembrando uma quebradeira de fato. As demais deveriam acompanhar um padrão semelhante.

- Algumas músicas da Caipiras já foram usadas à exaustão em outros arraiais por outras juninas. É preciso diversificar, correr atrás de canções mais raras.

- Há longos diálogos certamente cansativos durante a execução do enredo da Arrasta-pé de Açailândia. Quadrilha precisa dosar preciosamente o tempo dedicado à história e o destinado à dança, sendo possível até promover os dois no mesmo instante.

- Aprecio o trabalho multiartístico de Xico Cruz e creio que apesar de não ter incomodado, cabe a menção de algumas de suas falas terem sido gravadas previamente, quando teriam ficado bem mais interessantes caso fossem ditas ao vivo.

- A primeira música que abre o espetáculo da Flor de Mandacaru não foi acompanhada pelos eficientes pulmões das damas. Uma pena!

- A revelação de qual seria a tal bebida ficou um tanto bisonha pelo fato de que o público àquela altura já sabia de que bebida se tratava. Friso isso, pois o que mais me satisfaz no trabalho da Imperadora é o fato de não haver subestimação à inteligência do público, assim, tal revelação foi na via contrária a essa proposta.

Agradecimentos a
@TharlesPonciano, @GlauberJúnior, @IgorCamargo, @MatheusAlves, @NaMira, @RoberthNunes.


Até breve,
Carlos K. Fera


sexta-feira, 17 de julho de 2015

Sete fatores que tornaram a plebeia em majestade

 Imagem: Montagem de Danrley Fagundes

Após um período muitíssimo conturbado capaz de defenestrar a pessoa física deste bogueiro, aqui estou eu. E pela primeira vez, a motivação para meus escritos estão muito mais além do Arraial. Esta semana, enquanto cumpria minha labuta diária, integrantes da Queridinha de Açailândia abordavam diversas pessoas em busca de recursos para realizar uma viagem tranquila para Parnaíba. Nada tão excepcional se não fosse por uma antítese interessante: enquanto a nossa quadrilha do quebra-coco pedia com clemência valores na Açailândia Junina, refletia que curiosamente a plebeia tem em mãos o tema mais rico do ano.

Enriquecer pequenos tesouros para torná-los grandes foi a tarefa que conduziu a Babaçueira este ano. Um fruto tão pequeno, tão mínimo tornou-se amplamente comentado dentro e fora dos arraiás, servindo inclusive como referências para aulas e projetos de Geografia e História de uma escola. Em meus textos, sempre acreditei que um tema é uma bandeira que se finca num Arraial. Porém, graças à Flor, terei que repensar este conceito, acrescentando a palavra fidelidade. Afinal, “Meu sobrenome é babaçu” ultrapassou as barreiras dos tablados, invadindo conversas na mesa de bares, escolas e é claro, as redes sociais. Diante a eficiência do tema da Queridinha, K. Fera aqui enumera os sete fatores que fizeram a Flor ter um ano ímpar.

#Realidade sofrida versus realidade cantada
A escolha de um tema exige uma atitude bastante difícil: traduzi-lo para o universo junino. E como se sabe, essa roupagem é alegre, fantasiosa e colorida. Flor de Mandacaru desejava falar sobre as quebradeiras de coco. E para tanto, tinha de transitar entre o sofrimento dessas mulheres e a alegria que lhes é peculiar. A receita foi sabiamente apresentar no início do prólogo um quarteto senhoras que pareciam ter saltado diretamente de um documentário; além do padre Josino, figura real e importante que foi apresentado aos maranhenses. Tais mulheres trouxeram realidade ao tema, localizando-o temporalmente. E a fantasia ficou por conta da heroína Raimunda, que alternou momentos de bravura e romance à lá Cinderela.

#Diálogos e inserções bem construídos
Se alguém na plateia tivesse alguma impossibilidade de enxergar, essa pessoa não teria dificuldades de também apreciar o desenvolvimento da Flor. Os diálogos iniciais da apresentação da rainha dos babaçus, embora ligeiramente pendendo ao didatismo, estão bastante pertinentes. Os discursos em nome das quebradeiras de coco e do padre Josino garantiram impulsividade ao enredo. Com toda certeza, a fala final da personagem Raimunda garente grandeza, emoção, além de ser surpreendente. Amarra o tema de forma sagaz e finaliza a apresentação com elegância. Graças aos diálogos, temos certeza de que a definição das palavras que compõem o tema saiu de forma natural, garantindo precisão no que iriam defender.

#Trilha sonora consoante ao tema
Cada canção escolhida pela Queridinha causava uma emoção diferente na plateia. Longe de misturar drama e frescor num balaio de gato que poderia causar danos aos corações do público, a ordem das canções é muito apropriada ao carrossel de sentimentos que vivemos com a apresentação da Flor. Apelando para músicas em sua maioria desconhecidas do público em geral, os inventivos artistas da Mandacaru cultivaram canções ora simples, ora arrojadas, sempre capazes de encantar ao público. Grande destaque a Coco Babaçu S/A. A música que mistura drama, história de vida, humor, samba e frescor garantiu a saúde musical da Flor este ano. Tão evidente o acerto, que não tiveram medo de encerrar sua apresentação com o emblemático refrão “Pra quebrar o coco, o cacete tem que ser duro”.

#Figurinos que marcam a evolução do enredo
Devo admitir que este ano os figurinos não estiveram tão estonteantes na comparação com o ano anterior. Mas, do outro lado, creio que eles estão pertinentes ao tema. A não ser pelo incremento de sandálias que ficaram exuberantes nos pés das belas moças que compõem a quadrilha (por que não os cavalheiros?) os figurinos marrons não ficarão tão bem resguardados em nossas memórias afetivas. Porém, a Flor de Mandacaru conseguiu um efeito muito interessante: fazer o figurino acompanhar a evolução do enredo, o que o torna fantástico e anula quaisquer críticas. Enquanto víamos o drama de Raimunda perder suas terras, as damas trajavam o marrom, logo que a noiva descobre o amor,  num truque de figurino, elas trocam o marrom pela predominância do vermelho e os recatados lenços por tiaras de flores coloridas. Aí mora o coração do espetáculo!

#Marcador-divo
Embora mereça uma postagem dedicada somente a ele, Gustavo é um dos fatores que garantiram sucesso à Flor deste ano. Impossível dissociar o tema da figura do Padre Josino. Após um início como marcador não tão interessante, o artista decidiu investir no personagem que lhe deram, deixando barbas e cabelos crescerem para termos a impressão de estarmos realmente próximos ao padre Josino. Incrementando o enredo com emoção e seriedade, a figura do marcador deixa de ser um mero terceiro e passa a ser parte essencial da construção de uma história. Se o tema é majestoso, coroamos o imortal Gustavo como rei!


#Referências ousadas
Tudo o que vimos em vinte e cinco minutos respira babaçu. O fruto que é símbolo do nosso Estado está presente nos dramas e nas alegrias das quebradeiras. Ora como instrumentos de trabalho, ora como verdadeiras armas, o cacete e do babaçu estão perambulantes em todo o espetáculo nas mãos apenas das guerreiras mulheres. Seja na luta pela terra, quando o fazendeiro expulsa Raimunda, impossibilitando-a de garantir seu sustento ao momento em que o público recebe como presente alguns produtos confeccionados a partir do babaçu. A referência mais inteligente fica por conta do encantador vestido dos reis deste ano, que lembra o cofo onde são carregados os babaçus para a venda. O enredo da Flor poderia ter caído num didatismo terrível. Apresentar as quebradeiras como maranhenses que sofrem, mas que carregam o gene da alegria afastaram nossa Queridinha desse terrível fim.


#Interatividade com o público
Tão eficiente quanto lembrar que o babaçu se confunde com o maranhense, é mostrar ao público o que dá para ser confeccionado com ele. Embora o fruto tenha sido importante para a realidade econômica e cultural do nosso Estado, os artistas da Flor farejaram que os mais jovens nem o conheciam. Por isso, num dos momentos mais gostosos da apresentação, a Flor nos lembra que o enredo é a nossa própria história e que portanto, devemos estar presentes nela. Reiterando as quatro senhoras quebradeiras que aparecerem no início do espetáculo do drama, elas aparecem adorosamente simpáticas cantando e oferecendo ao público os derivados do babaçu.  Essa parceria com a plateia a fez cúmplice e por isso esta elegeu a Flor como uma das melhores quadrilhas juninas deste ano.


Há apenas um fato que devo admitir sua crueldade: infelizmente, são apenas vinte e cinco minutos de apresentação. Essas duas dezenas e meia de minutos são suficientes aos jurados entenderem porque o grupo merece medalhas de ouro em 2015. Porém, para nós, carentes espectadores, parecem passar num verdadeiro apagar das luzes. Tenho certeza que se tivessem noventa ou sessenta minutos, ainda assim teríamos uma apresentação graciosa e emocionante. Afinal, caros leitores, não podemos nos esquecer de que o enredo da Flor é uma fantasia que se entrelaça à nossa história. Graças à sede de viver de uma quebradeira avó é que estamos aqui apreciando mil e quinhentos suculentos segundos de apresentação memorável da Flor de Mandacaru. Desse jeito, melhor não pensar na maravilha que poderá vir em 2016!

Com os cumprimentos de,

Carlos K. Fera


*As imagens desta postagem foram colhidas aleatoriamente das páginas pessoais do facebook dos componentes da Flor de Mandacaru.


sexta-feira, 10 de julho de 2015

Um ano das noivas

Depois de um 2014 mais que impecável, em que nós, carentes espectadores de cultura, vimos espetáculos mais que grandiosos, chegou 2015. Novas histórias, coreografias mais ousadas, enredos mais fiéis, trilhas sonoras ainda mais gratificantes tomaram conta dos tablados este ano. Resultado: incontáveis convites a nossas juninas para festejar o arraial de outras cidades. Num ano em que tanta arte boa se destacou, a personagem de branco de cada grupo junino brilhou junto e separadamente dos demais. Foi um ano em que nossas noivas, das mais salientes às mais recatadas, brilharam nos tablados e mostraram que suas escolhas não foram resultados do mero acaso. Desde o uso de saltos altos e a novidade, humildes sandálias, elas mostraram que apesar do marrom, azul, ou o colorido, o branco ainda impera majestosamente. K. Fera destaca a importância do véu e da grinalda em 2015.

Valéria Souza – Flor de Mandacaru
Uma das mais belas surpresas de 2015, não tinha o mesmo destaque ano passado. Valéria recebeu das mãos dos inventivos artistas da Queridinha de Açailândia, a tarefa de interpretar a quebradeira de coco que dá origem ao mais forte enredo deste ano. Com o desafio de levar o espectador às lembranças de seus antepassados, a babaçueira não tremeu e mostrou perfeição nos momentos em que tinha de interpretar a doce Raimunda e garra nos momentos que tinha em mãos a guerreira quebradeira de coco. Com um figurino graciosamente mutante, Valéria transitou com exatidão entre os papéis de jovem apaixonada e mulher que luta. Muitas faces encarnaram no corpo de uma única artista! E para aqueles que não têm lembrança da juventude de suas mães e avós quebradeiras de coco, guardaram na memória a linda imagem de Valéria quebrando o coco babaçu com o cacete ao fim dos curtos vinte e cinco minutos da apresentação da Flor.

Gleivane Campos – Caipiras da Serra
Vestir de azul a noiva mais terna do ano que passou  revelou-se um grande acerto da Caipiras da Serra. Num enredo interessante, Caipiras decidiu falar da pedra Turmalina, e assim como esse blogueiro preveu, decidiram personificar essa preciosa pedra nos tablados. Enquanto víamos o noivo garimpeiro conquistar sua fortuna, Gleivane perambulava timidamente no arraial vestida em tons de azul e branco. Como se só o público pudesse percebê-la, a personagem pairava mudamente permitindo-nos entender que a maior riqueza do garimpeiro estava ali o tempo todo e ninguém da trama conseguia apreciá-la, como nós, espectadores, fizemos durante os momentos iniciais da apresentação. Surpresa maior é quando a enxergamos vestida de branco, exibindo um dos mais belos vestidos e penteados da Açailândia Junina. Com graça, sorrisos e muito domínio coreográfico, Gleivane conquista os 67 corações de sua quadrilha, antes cegos, e qualquer multidão que a assista.

Ana Beatriz – Arrasta-pé
O ano, para uma das juninas mais tradicionais da cidade de ferro, mostrou-se promissor. Depois de um enredo levemente superior à arte do ano passado, tiveram a presença de uma noiva espetacular. A quadrilha junina, embora já não lembre a mesma tradicional que brilhava no ano de 2006, ainda guarda uma característica que a faz reviver esses tempos: canções ferozes, que exigem de seus componentes doação total para executar as coreografias. Talvez tal fato justifique ainda o nome dessa quadrilha. Nesse quesito, Ana Beatriz brilhou como a personagem de branco e garantiu o sucesso junto à plateia. Que tal graça possa ser vista no ano que vem na Açailândia Junina.

Joselita Marques – Matutos do Rei

Bem sabemos, caros leitores, que a Imperadora não tem medo de inovar, nem que isso custe críticas à sua arte diferenciada. E nesse ano, após sugerirem quatro noivas no doce arraial do pescador, sabiam que novamente tinham de reinventar a roda. Não foi por acaso, a escolha da jovem Joselita para protagonizar o espetáculo da Receita. Precisavam de uma noiva que fugisse dos padrões; ora saliente, ora debochada, ora sonsa, ora escandalosa, que dançasse e atuasse como nenhuma outra no Arraial. Encontraram todas essas características em Joselita, que vejam só a ironia, é uma noiva que vale por quatro. A artista parece estar se divertindo nos tablados, embora encharcados de teatralidade, os movimentos da noiva que não casou virgem soam tão naturais que culmina na vontade de subir no Arraial e ser mais um noivo para disputá-la.

Ágda Santos – Junina Koroné
A simplicidade do tema da Koroné engalfinhou-se com a exuberância de seus componentes. E o resultado foi excelente! A balsense trouxe uma explosão de cores e criatividade marcada por uma história pueril, mas eternamente bonita. Nesse meio, Ágda Santos brilhava como Luara, a Lua, que mantinha um caso de amor com a estrela mais importante do universo. A noiva, que vivia no embate de encontrar seu amado, já que Sol e Lua alternam sua iluminação sobre a Terra, deu vida a um enredo sobre o amor entre diferentes. E no ápice da apresentação, quando o Sol e a Lua finalmente se encontram, a noiva ganha seu momento mais memorável e torna-se mais que um mero satélite: uma estrela. Ágda manteve-se brilhante nesse enredo gracioso e com uma missão bastante difícil: estar à frente, marcando um alinhamento que este ano, foi primoroso.

Obs.: Todas as imagens que abrilhantam esta postagem foram reproduzidas diretamente do perfil do facebook das referidas.
Obrigado, Igor Camargo e Matheus Alves.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Da suavidade das ondas do mar à agressividade do líquido sagrado

Imagem: Site AçaiVip

Depois de uma longa demora, eis que me faço novamente presente nesse sítio virtual pelo qual tenho extenso carinho. Mas novamente minha ausência tem explicação. Após uma série de atividades que a pessoa física por trás desse incógnito bogueiro teve de cumprir na sua vida chata e rotineira, não sobrou tempo para essa figura K. Fera se expressar. E há um pouco de culpa nas agendas das protagonistas juninas de Açailândia. Esse ano, para desespero de meu escasso tempo, elas estão maiores e cada vez encantando outras cidades satélites fora do eixo desse bogueiro. Resultado de trabalhos cada vez mais detalhistas e ousados.

Após um ano de extenso trabalho, digno das quadrilhas pernambucanas, a arte da Matutos do Rei deste ano, tinha um desafio muito alto, que era propor algo ainda superior ao tão delicioso mar da Ilusão que Xico Cruz e Tharles Ponciano construíram nos tablados de 2014. Por si só, isso representaria uma cruz muito pesada, pois o interessante espetáculo do ano passado, em que figurinos, coreografias, teatro, trilha sonora tiveram um sobressalto divino, dentro de um conceito estrutural detalhado, determinou um novo momento da história da Açailândia Junina, levando aqueles jovens artistas para concorrer com as devoradoras do Nordeste. A Imperadora não teve receio, confiando-se em seu espetáculo leve e gracioso, fez nosso Estado ter uma nova colocação na disputa, o que representa um marco na história do município e do Maranhão.

Com um espetáculo saboroso, envolvente e por vezes, apaixonante, Matutos viu no mês de Agosto do ano passado um desafio afável. O quê colocar em prática no ano seguinte? Tal interrogação, meus caros leitores, intrigou a minha jovem mente que respira cultura junina há pouco mais de uma década. E inacreditavelmente, a Imperadora decidiu ir pelo caminho da antítese: a agressividade do espetáculo. Sim! Se ano passado tínhamos a leveza transpirando até nos banners que ilustravam o espetáculo, seus artistas esse ano decidiram ser mais agressivos. Mostrar nos diálogos, figurinos, trilha sonora e coreografia um espetáculo mais viril e com certeza, tão sedutor como a leveza das águas azuis de um “mar salgado”.

Tal agressividade estava encharcada nos figurinos que este ano a cor escolhida foi a predominância marrom, no maior duelo em relação ao ano anterior da Imperadora. Nas coreografias, um forte teor teatral que se construiu belamente na figura dos noivos e dos vilões do prólogo, saltos quase ornamentais, tudo temperado com caras e bocas como nos antigos filmes mudos, além da padronização militar de, entre outros, barbas e gestos. Nos diálogos, uma linguagem mais carregada, falas ora mais cruas e fortes, em tons mais altos, além de um humor já patrimônio desse grupo junino. Enquanto isso, a trilha sonora embalava um resultado multiartístico excelente, com referências ousadas à cavalaria medieval, mitologia romana, regionalismo nordestino e uma dose de fantasia tão necessários ao folclore junino. Nesse último aspecto, houve uma escolha interessante, porém um pouco preocupante no que diz respeito à remasterizaçao das canções mais antigas.

O grupo junino apresentou um enredo bem amarrado, coerente e ora ou outra até instigante. Investindo no mistério de qual seria a receita de um tal líquido sagrado realizado pelo pai da noiva, o enredo levava o espectador uma conclusão mais que óbvia. Embora estrambótica fosse a obviedade, o momento da descoberta de qual era finalmente a bebida que tornava o padre tão alegre, a revelação foi um tanto desanimadora. Não conseguiria concluir se tal fato se deu pela forma como a revelação foi apontada ou mesmo se era necessário ao enredo deixar claro ao esperto espectador que a bebida, tão obscura aos personagens da trama, tratava-se da cachaça.

Bem verdade que as surpresas deste ano que marcaram a respeitável história da Imperadora foram os figurinos cada vez mais exuberantes, um enredo ainda mais varonil, uma trilha sonora eficiente, e claro uma noiva excelente que fugiu do estereótipo de virgem e santa, últimas características que o enredo inovador exigia. Não sou fã das comparações, mas esse texto reclama. No confronto da agressividade contra a suavidade, creio que a primeira tem mais chances de se impor. Mas no que diz respeito à cultura junina, essas forças se somam. Diria que Matutos do Rei conseguiu novamente se destacar nos arraiás que frequentei embora a arte desse ano não fique tão bem resguardada nas nossas memórias de espectador como o duelo azul-branco do ano passado. Do outro lado, o enredo mais adulto e agressor mostrou que esse grupo cultural tem ainda os pulmões – como eles mesmos provaram ao cantar à capela diversas vezes na apresentação – eficientes para vocalizar que são sim, um dos melhores grupos que temos na tão já ilimitada Açailândia Junina. Salve Imperadora!

Com os cumprimentos de,
Carlos K. Fera

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Koroné: O Sol, a Lua e suas distâncias exponenciais

Imagem: Angra Nascimento/Imirante Imperatriz

Um ano passou rapidamente. Já estou eu aqui, caros leitores, a falar de uma das gratas surpresas do Arraial de 2015. A Arraiá do Koroné, a junina que vem de Balsas, decidiu apostar num tema de uma simplicidade tamanha que chegou a intrigar a mente deste blogueiro feliz. Sabia que Junina não ia pretender temas raros e escassos. Sua aposta seria algo simplório, flertar com o sonho e a fantasia uma nova vez e garantir algo que só encontramos na radioatividade: enriquecer uma matéria e transformá-la em energia.
Para quem gosta de Astronomia, a distância entre a lua e o sol é de mais de cento e quarenta e nove milhões de quilômetros. E creio que o tema que a Koroné trouxe, versando sobre esses astros celestes, diz bem do fenômeno que ocorreu com ela entre o ano passado e o corrente. O grupo de Balsas explodiu, estourou, garantiu uma apresentação muitíssimo superior ao belo trabalho que colocaram em prática no ano passado. Inovando em vários aspectos, eu diria que o espetáculo “Do outro lado da vida” seria a Lua, tão próxima e confortável ao lado da Terra, enquanto “O sol e a lua” representaria bem a estrela maior, o Sol, que incendeia, ilumina, dá força e faz raiar o dia.
Vem clarear meu Arraial, se propunha Rhaoni Silva num dos mais belos e mais empolgantes momentos de sua carreira. Sabendo aproveitar as críticas que lhe são favoráveis, o marcador deixou certos tons que ano passado afirmei estar mais próximo de um narrador de rodeio, e investiu na sua incrível capacidade de encantar o espectador. Tanto que o marcador pôde colocar-se entre o duelo dos astros celestes, passeando entre eles com harmonia. E veio com uma arma poderosa e bastante oportuna para contar o romance entre o sol e a lua: contar essa história como se estivesse narrando uma história à filha. Tal arrojo permitiu imprimir um tom lúdico à apresentação e simultaneamente, aproximar-se do público, transportando o espectador a ouvinte íntimo da história. Em certo momento, a Koroné não mais esbanjava um espetáculo, e sim promovia-nos ao diálogo.
Vestir metade dos pares com a roupagem amarela em referência ao sol e os demais com figurinos que ilustravam a lua parecia uma proposta previsível. Porém, a Koroné deixava claro que queria promover o eclipse, o encontro entre o sol e a lua, esses astros tão bem distantes como mesmo disseram, tão diferentes, mas capazes de se misturarem para formar uma unidade. Nesse momento, a Koroné atinge seu auge! Não há nada mais belo que uma história de amor bem contada, e a metáfora que a balsense semeou no arraial realizando a interseção entre o sol e a lua conduziu seus brincantes a uma arte refinada. Embora o compromisso fosse a ficção, a Koroné prendeu seus pés no solo e disse que embora diferentes ou distantes, todos os seres que se amam devem ficar juntos.
Com uma trilha sonora mais um tanto rara, algumas mais bem escolhidas que outras, temperadas com canções compostas pelo grupo. A Arraiá este ano preferiu investir em algo que nos levou às expressões juninas pernambucanas: a música ao vivo. Foi um grande acerto e espero que vantagens competitivas como estas sejam repetidas pelos demais grupos juninos. Faz-nos entender que a Koroné tem um tanto a mais de arte a oferecer a seu fiel público.

Um alinhamento primoroso, figurinos exuberantes e uma característica só encontrada nela: Arraiá é uma quadrilha de nomes e valoriza quem está fazendo aquela engrenagem se movimentar. Dançarinos tão talentosos que não merecem estar no anonimato. Na voz de Rhaoni, pessoas tomavam forma e eram veiculados ao público. Àguida Santos, o noivo e a rainha tiveram seus nomes imortalizados num arraial que, com certeza, daqui a cem anos ainda terá fôlego para encantar novos amantes da cultura junina. Se cada pessoa que ali presenciava a força dessa apresentação representasse um corpo celeste, eu diria com toda a certeza que o universo gostou de ver esse eclipse junino do sol e da lua.

Com os parabéns celestiais de,
Carlos K. Fera.


quinta-feira, 18 de junho de 2015

Caipiras da Serra: uma mina de história e um cascalho de execução




Imagem: Na Mira

Devo mais que mil palavras a um dos grupos juninos mais interessantes da Açailândia Junina. Ano passado, à época do parto de K. Fera, quando a pessoa física por trás desse personagem hoje admirável não tinha ideia de onde meia dúzia de palavras críticas às apresentações das juninas iriam parar, não pude reparar com calma a arte que a Junina queria expor. Então, reservei-me à execução do silêncio, já que não possuía tantas referências quanto desejava para divulgar a arte dos Caipiras. Este ano, para recompensar, tive o zelo de assistir a cada detalhe dessa apresentação que apesar da dívida secular, outro motivo persistiu: acompanhar uma boa história sobre garimpeiros e pedras preciosas, matéria que muito ainda me afaga.

O tema do grupo muito me agradou a princípio. Embora longo e cansativo, o título do tema deixava bem evidente que falaria de uma preciosidade muito querida no Nordeste: a turmalina. Logo os neurônios deste blogueiro trabalharam arduamente. Coitados! Visualizaram múltiplas possibilidades de enredo. O velho sonho do garimpo, apesar de quase já esgotado nos arraiás de Pernambuco e Ceará, permite reviver uma emoção tipicamente nordestina: o fim do sofrimento pela riqueza

Apesar de uma ideia tão arriscada na cabeça, os artistas do Plano da Serra desenvolveram um enredo fabuloso. Sim, caro leitor, fabuloso! O texto da Caipiras estava primoroso e só quem não tem sensibilidade poética (pobres criaturas!) não poderia deixar de se sensibilizar com um enredo tão suculento. O amor da pedra mais preciosa da Paraíba com um garimpeiro foi um acerto tremendo, promovendo o bom gosto desse grupo junino ainda em desenvolvimento. Poetizar sobre o sentimento que um garimpeiro mantém pela pedra mais preciosa, esta personificada, do sertão da Paraíba, foi uma obra de arte digna de reverência. O texto puro da Junina irradia emoção a quem lê.

Pena que o quê sobrou de precisão na escolha da narrativa, faltou em outros aspectos da junina. Logo à primeira vista, se o espectador não tivesse feliz de ouvir um texto tão bem construído, poderia verificar que houve um descompasso entre algumas músicas e as coreografias propostas. Algo não funcionou ali. Ademais, um aspecto que a Imperadora e a Queridinha de Açailândia sabem executar com notório esmero, esgotou-se nos áudios dos doces caipiras: com exceção de uma ou duas músicas raras, a trilha sonora preferiu ir por um caminho confortável, apresentando canções já exaustas de serem veiculadas no arraial. Uma pena! E tal situação chegou a um nível crítico quando a apresentação da personagem Cleópatra trouxe uma música que mais parecia ser extraída de um jogo de vídeo-game antigo.  Algo que destoou do tipo de arte já refinada que o enredo defendia.

Soma-se a esses fatos um tanto maior de ânimo que seu marcador necessita para dar voz de comando aos componentes e suscitar emoções na plateia. Também é necessário encher os pulmões e dizer que tem orgulho de participar desse movimento junino. Seja em qualquer grupo junino que se encontrar, ter orgulho da sua Flor, dos seus Matutos, dos seus Caipiras ou de suas Maravilhas é o que impulsiona uma centena de brincantes a emocionar milhares de coadjuvantes espectadores. E isso, infelizmente faltou. É  preciso mostrar que cada componente se diverte ao realizar as coreografias, ao gritar para o público “eu sou da Caipiras” e incendiar a plateia com seus pulmões já estafados. A teatralidade nas mãos, um recurso que chamou a atenção durante as coreografias, embora bem elaborado, perdeu-se num grupo que parecia mais interessado em acertar as coreografias a entregar-se à poesia da sua trilha sonora. Essa entrega da qual falo é fundamental!

A caça à turmalina por um garimpeiro apaixonado revelou-se um dos melhores planos da noite de sábado. Pena que a história tão encantadora tenha se perdido em detalhes que poderiam sim ter sido sanados até à meia-noite de sexta-feira, possibilitando uma colocação mais à altura. E a destinação do meu primeiro texto integral aos doces Caipiras não sirva de tristeza. Que acreditem neste internauta ousado: o triste aqui fico eu. Deem, como meu presente, a mais preciosa turmalina a quem escreveu o texto fino da apresentação, afinal vestir a noiva de azul, deixando-a estonteante tal qual a pedra, personificá-la como uma das maiores ambições do garimpeiro e promover esse encontro em forma de casamento fabuloso merece sim ser premiado. Pena que toda a expressão por trás dessa narrativa arrojada não tenha acompanhado igualmente essa história comum, mas não menos cativante. Uma turmalina que ficou ofuscada em meio ao cascalho. Que tal livrá-la dessa condição e fazer de 2016 um ano mais rico? Tenho certeza de que os caipiras da Açailândia Junina saberão onde garimpar esse sonho.

Com os cumprimentos de,
Carlos K. Fera.

terça-feira, 16 de junho de 2015

Flor de Mandacaru: o esmero do cacete e o requinte do Babaçu

Imagem: Armando Olegal


Um Arraiá da Mira para ficar na história. Essa é a impressão que tive. Um espetáculo dessa natureza, com a apresentação de mais de duas dezenas de grupos juninos não pode passar incólume na nossa história cultural cujo aspecto junino ainda persiste em engatinhar. Qualquer apresentação que se preze, oferece três óticas de apreciação: de quem dança ou atua, de quem prestigia e de quem julga. No alto da coadjuvância de quem simplesmente pagou meia entrada para ver mais de vinte lindos grupos mostrarem o resultado de um ano de talento concentrado, percebi eu que se não posso entender a ótica de quem dança, muito menos agora compreenderei o que há por trás de quem julga. Não tomo como ambição deixar de apreciar o espetáculo para julgá-lo. É uma tarefa muito hercúlea e não a quero. Porém, não deixa de ser curioso como o modo que um grupo traduz a emoção de quem curte ver não necessariamente influencia o resultado de quem avalia.

No sábado, o grupo Flor de Mandacaru conseguiu algo já além das previsões de qualquer blogueiro: superaram a Teimosia da Fé e construíram um espetáculo digno dos aplausos dos milhões de maranhenses que estão espalhados neste país. Vocalizaram em seus discursos uma personagem esquecida pelo próprio povo maranhense: a quebradeira de coco. Beber nessa fonte rara e escassa não é para qualquer camelo. Um enredo, que traduziu o maranhense em uma frase, suscitou os maiores sentimentos e emoções que até mesmo quem esqueceu suas origens teve de revivê-las. E as reviveu por meio dos personagens mais charmosos que vi este ano: Raimunda Babaçu e José Cacete.

O coração do público é tal qual um coco que precisa ser quebrado. Porém essa pancada de cacete de emoções que a queridinha de Açailândia deu no babaçu que reveste nossos corações foi mais que agressiva. Logo no início, apresentou a história de quatro quebradeiras que mais pareciam ter sido arrancadas diretamente de um documentário para a frente do público. Em seguida, abre-se o espetáculo com uma elegante coreografia das damas fazendo uma homenagem humana às personagens principais do enredo, lembrando-nos que na verdade não apenas era o aspecto do sofrimento dessas mulheres que estavam em destaque. Por fim, fechando os primeiros sete minutos mais bem elaborados da noite, os cavalheiros surgem como se tentassem sucumbir as quebradeiras de coco. O olhar de bicho de cada componente daquele grupo eriçou a epiderme de cada corpo humano que assistia orgulhosamente ao espetáculo. Ouso dizer que, ano a ano, o olhar penetrante da Flor vai se tornando um de seus maiores atrativos.

Mas o enredo de tão linear e apaixonante teve uma receita muito simples: contar a história de luta de apenas dois personagens, a quebradeira Raimunda e o padre Josino. Num dos maiores momentos do marcador Gustavo, ele vestiu-se de pura emoção e encantou como um padre real, seja no transmitir de suas emoções ou na aparência. Quem defendeu Raimunda surpreendeu. A consistência de sua apresentação pelo tom de realidade que Valéria imprimiu à personagem a promoveu para uma das mais agradáveis surpresas da noite. Sorte de Iolanda e companhia que mais uma vez acertaram com precisão na escolha de seus destacados.

Sem perder o brilho, o gingado e o fogo que já é característico dos trabalhos da Flor, lá foram eles mais uma vez inovar. A interatividade entre as quebradeiras e o público, aquelas presenteando estes com produtos extraídos do babaçu foi o que mais chamou a atenção de quem ali prestigiava. Foi a maneira com que a Queridinha nos alertou de que aquela é a nossa história e portanto, precisamos de alguma forma, estarmos incluídos nela. Chamaram-nos para dançar, interagir e saborear ao som de ”Coco Livre S/A”. A vontade de qualquer mortal era pular as cercas do tablado e participar daquela forte emoção que aquela altura já havia ganhado olhos e corações atentos.

Enfim, veio o segundo lugar. Algo que, junto ao calor do publico presente, pude perceber que não era o resultado esperado. Mas não há problemas. Cada espectador sagrou no seu arraial particular seu grupo junino campeão. Pessoas que têm em sua árvore genealógica, mães, avós e bisavós que muito lutaram para a construção dessa terra que dia 13 recebeu o mais intenso espetáculo de 2015. E os meses de Junho e Julho ainda não acabaram. A Flor ainda tem mais de cinco milhões de maranhenses para arrebatar. Que comecem, então, os jogos juninos!

Com os cumprimentos de,

K. Fera cujo sobrenome também é babaçu!